Abaixo uma série de biografias de grandes diretores do cinema mundial disponibilizados por ordem alfabética:
AKIRA KUROSAWA (1910 – 1998)
Nascido em Tóquio-Japão no ano 13 da era Meiji
(1910), Akira (“O Luminoso”, em japonês) sempre buscou a diferença em sua arte
e em sua vida. Descendente de uma família de samurais, passou a vida
confeccionando sonhos em celulóide. Um verdadeiro imperador reverenciado no
mundo inteiro e desprezado por seu próprio povo. Em sua infância, apesar da
descendência de Samurais, expressava tal fragilidade a ponto de chegar a ser
chamado pelo humilhante apelido de Kompeito-san, uma alusão aos confeitos que
se derretiam. Aquele menino sensível se desmanchava em lágrimas diante da
rigidez do sistema educacional japonês. Contradições de um espírito com
inequívoca vocação para o conflito. Um cineasta com fama de rígido, mas de
cujas mãos surgiram obras primas delicadas e de rara beleza. Um diretor de
cenas complexas, mas incapaz de dirigir um automóvel. Tentou a carreira de
artista plástico, mas foi reprovado na Escola de Belas-Artes. Mais tarde,
depois do que classificou como sua “fase rebelde”, integrou os estúdios
cinematográficos Toho, em 1936. O início foi como roteirista e logo passou a
assistente de direção de Kajirô Yamamoto – que ele carinhosamente chamava de
Yama-san. Seu primeiro filme foi Sugata Sanshiro (A Lenda do Judô), de 1943.
Sucesso. Cidadão do mundo, Kurosawa bebeu na arte e na cultura ocidentais, sem
maiores temores. “Não importa para onde eu vá, e embora não fale outra língua,
nenhum lugar é estranho o suficiente para mim. Sinto que a Terra é meu lar”,
disse em seu “Relato Autobiográfico” (publicado no Brasil pela editora estação
Liberdade). Suas incursões foram além da música de Beethoven, Haydn e Schubert,
que usou em trilhas sonoras de seus filmes. Apaixonado por Shakespeare, filmou
Ran e Trono Machado de Sangue, respectivamente adaptações de Rei Lear e
Macbeth; além de O Idiota, inspirado da obra de Dostoiévsky, e Ralé, adaptado
na obra de Gorki. Transcendeu a gêneros, períodos e nacionalidades, sem jamais
relegar a segundo plano a sua própria cultura, aquele peculiar jeito nipônico,
manifestado na movimentação dos atores, nas caracterizações de personagens de
teatro Nô. Mas nada se compara a seu amor pela personalidade controversa e pela
obra genial de Vincent Van Gogh. O episódio “Os Corvos”, do filme Sonhos, é uma
amostra de um desejo manifesto que Kurosawa deixou irrealizado: filmar a biografia
do pintor holandês. O ocidente já o reconhecia como mestre e mago. Era o
imperador do cinema japonês, mas o Japão insistia em não compreendê-lo.
Acirravam-se as acusações de ser ocidental demais e os financiamentos para
novos filmes tornavam-se cada vez mais difíceis. “Havia sempre um anjo em minha
vida”, costumava dizer, referindo-se à sorte que dizia acompanhá-lo. Em 22 de
dezembro de 1971, ano 46 da era Showa, o anjo que o protegia perdeu espaço para
o desespero e Kurosawa tentou o suicídio cortando os pulsos, deprimido com a
incompreensão de seu próprio povo e as críticas que recebia. No ano seguinte o
socorro veio da ex-União Soviética, onde filmou o aplaudido Dersu Uzala. Sobre
essa experiência, disse Kurosawa: “Um desses salmões, não vendo outro caminho,
empreendeu uma longa jornada para subir um rio soviético e dar à luz algum
caviar. Assim surgiu meu filme Dersu Uzala em 1975. Nem eu penso que seja essa
uma coisa ruim. Mas o mais natural, para um salmão japonês, é pôr seus ovos em
um rio japonês” - Referia-se ao fato de que sempre se considerou um “salmão,
que jamais esquece o lugar que nasce”. Sua vida pontuou seus filmes. Foi
autobiográfico sempre. Em muitos momentos, a personalidade do diretor mergulhou
no mundo de celulóide, renascendo nas almas dos personagens. E em 1990, ano 2
da era Heisei, recebe o Oscar Honorário pelo conjunto de sua obra da Academia
de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood. O mais tocante e belo em
toda a obra de Kurosawa está justamente na grandeza de sentimentos. Seus
últimos filmes, Sonhos, Rapsódia em Agosto e Madadayo são pinceladas intimistas
sobre a velhice, a morte, o tempo. Perguntado sobre o que faria se tivesse o
poder de influenciar a sociedade e mudá-la, ele disse simplesmente: “Daria o
melhor de mim para aproveitar minhas habilidades como artista. Eu sou feliz
porque tenho a chance de me expressar”. Kurosawa sempre teve uma sensível visão
do mundo e de sua natureza, para ele o homem deve muito ao planeta por tê-lo
maltratado tanto e a arte é uma das formas de pagar essa dívida. PRINCIPAIS
FILMES: Sugata Sanshiro, 1943 - Os Homens que Pisaram na Cauda do Tigre, 1945 -
O Anjo Embriagado, 1948 - O Escândalo, 1950 - Rashomon, 1950 - Hakuchi-O
Idiota, 1951 - Viver, 1952 - Os Sete Samurais, 1954 - Trono Manchado de Sangue,
1957 - Yojimbo-O Guarda-Costas, 1961 - Céu e Inferno, 1963 - Dodeskaden-O
Caminho da Vida, 1970 - Dersu Uzala, 1975 - Kagemusha-A Sombra do Samurai, 1980
- Ran, 1985 - Sonhos, 1990 - Rapsódia em Agosto, 1991 - Madadayo, 1993.
ANDREI TARKOVSKY (1932-1986)
Considerado persona non grata pelo governo da
ex-União Soviética, desde o início de carreira, o cineasta não abria mão de
suas obsessões. Quando fez Solaris, sobre um planeta oceânico dotado de
inteligência, capaz de fazer os astronautas de uma expedição materializarem os
sonhos mais ocultos, recebeu elogios de Akira Kurosawa, que considerou o filme
assustador. Mais tarde, o mesmo tema do confronto entre o conhecimento e o
mistério da existência é retomado em Stalker. Tarkovski, porém, estava acima
dos gêneros. Filosofava pela arte, para ele o único meio de crescimento
espiritual. “O cinema é uma arte infeliz porque depende de dinheiro. Não só
porque um filme é sempre muito caro, mas pelo fato de ser visto como algo
comercial, como cigarro”, dizia. O que não impediu que sua curta obra se
revelasse de grande intensidade. Nascido em Moscou, filho do célebre poeta
Arseni Tarkovski, Andrei estudou música, pintura e a língua árabe na infância e
juventude. Trabalhou em prospecção geológica na Sibéria e só aos 24 anos
começou a se interessar por cinema. Poeta, Filósofo, Cineasta, Tarkovski tinha
idéias bastante claras sobre os segredos da sua arte. Por exemplo, ele dividia
os cineastas em dois grupos: aqueles que procuram reproduzir o mundo à sua volta
e aqueles que, numa direção oposta, criam seu próprio mundo particular.
“Geralmente, estes são os poetas”, dizia, alinhando na categoria, entre outros,
os nomes de Ingmar Bergman, Luis Buñuel e Akira Kurosawa. Autor de oito filmes
personalíssimos, Tarkovski se incluía no grupo dos poetas da imagem. Nas suas
histórias desenvolvidas à deriva, cenas impregnadas de um sentimento secreto se
alternam como verdadeiras epifanias. São amantes que levitam ou se lançam ao
solo numa desesperada tentativa de se fundirem à terra; casas que incendeiam;
chuvas que lavam a alma de personagens emudecidos diante do mistério da
natureza e da existência. Nos filmes de Tarkovski, algumas perguntas parecem
tão importantes quanto suas respostas. Sua obra se apresenta como um meio de
assimilação do mundo, um instrumento que busca compreendê-lo. A expressão
artística seria uma experiência subjetiva, através da qual o homem procura
apreender a realidade. Para Tarkovski, uma das grandes particularidades da
arte, é sua intenção de persuadir as pessoas não através de argumentos
racionais, mas sim a partir do impacto emocional. A arte tem de ser sentida,
pois o artista a impregnou como uma energia que transcende a razão de um
diálogo meramente jornalístico. Desta forma um espírito de comunhão entre o
artista e o público é essencial, pois o criador não busca a comunicação através
do científico. Filmes são feitos para que os homens tentem se comunicar,
partilhar informações e assimilar experiências. Seus dois últimos filmes foram
feitos no exílio: “Nostalgia”, na Itália em 1983 e “O Sacrifício” na Suécia em
1986. Tarkovski rodou este último com câncer e morreu logo depois de
finalizá-lo. Quando instado a explicar o sentido de seus filmes, ele respondia
com a seguinte metáfora: "Você olha um relógio. Ele funciona, mostra as
horas. Você tenta compreender como ele funciona e o desmonta. Ele não anda
mais. E no entanto essa é a única maneira de compreender..." FILMOGRAFIA:
A infância de Ivan (1961), Andrei Rublev (1966), Solaris (1972), O Espelho
(1974), Stalker (1979), Nostalgia (1983) e O Sacrifício (1986).
DAVID LYNCH
Uma pessoa verdadeiramente multifacetária.
Ele divide seu tempo entre várias atividades artísticas como o cinema,
literatura, pintura, escultura, cartoons, fotografia, produção televisiva e
composição musical. Conjugando de forma inteligente as exigências do universo
cultural com tendências artísticas experimentais, Lynch tornou-se um dos mais
respeitados cineastas da nossa era, avançando com uma visão de mundo
caracterizada pelo seu original obscurantismo e pela utilização de um sentido
cômico tão bizarro quanto amargo que, somados, formam um conjunto de estranha
beleza. Conseguiu a fama e o respeito do público e da crítica, contribuindo
para uma alteração profunda dos gostos e ideologias do cinema norte-americano.
Direção de arte impecável, sonoridade intensa, elementos que se repetem a cada
filme, e esquisitices sem nexo postas ao acaso na narrativa são elementos do
universo lyncheniano. Porém, suas obras são bem mais profundas do que aparentam
e lançam, com propriedade, foco no lado escuro da alma humana. O que temos em
Lynch é uma constante busca pela 'imagem diferente'; uma imagem arrebatadora e
inesquecível, cuidadosamente trabalhada, e que, por vezes (mas não sempre) utiliza-se
do surreal e do obscuro para causar impacto, e fazer-nos entrar no clima.
Clima: essa sim é uma boa palavra para definir a obra do diretor. Os monstros
“lynchenianos” não são propriamente reais, e sim manifestações do real. Eles
são uma forma quase metafórica de nos mostrar a realidade, aquilo que não
queremos enxergar. É como aquele medo de infância de olharmos embaixo da cama
ou dentro do armário e virmos lá um monstro; Lynch nos diz que sim, eles
estarão lá assim que ligarmos as luzes. Lynch nasceu em 20 de Janeiro de 1946
em Missoula, uma pequena cidade do estado americano de Montana. Sua juventude
passada na Filadélfia foi um eterno tormento para ele, onde se viu perdendo o
controle de sua vida, engravidando sua namorada e se vendo obrigado a casar com
ela. Todo esse pesadelo claustrofóbico e sentimento de ter perdido o tato com o
real, juntamente com a assustadora paisagem industrial da Pensilvânia, viria a
se transformar no primeiro longa-metragem do diretor, Eraserhead (1976). Diz a
lenda que ele chegou a trabalhar de encanador para cobrir as despesas desse seu
primeiro longa. Destaques: 2006 - Inland empire, 2001 - Cidade dos sonhos, 1999
- A história real, 1997 - A estrada perdida, 1990 - Coração selvagem, 1990 -
Twin Peaks, 1986 - Veludo azul, 1980 - O homem-elefante, 1976 – Eraserhead.
FEDERICO FELLINI (1920-1993)
Fellini nasceu em 1920, em Rimini, pequena
cidade litorânea da Itália. Começou como jornalista em Florença, na revista de
humor "Marc Aurelio", demonstrando ser excelente desenhista e
caricaturista. Logo depois, passou a escrever pequenos roteiros e piadas para
comediantes. Seus mestres no cinema foram Rossellini, para quem trabalhou em
vários projetos (inclusive "Roma, cidade aberta" e
"Paisà"), adquirindo conhecimento da mecânica da produção
audiovisual, e Lattuada, com quem co-dirigiu seu primeiro filme. A inspiração
neo-realista é evidente na primeira fase de suas obras, com muitos personagens
populares, de fácil identificação e grande carga emocional. Pouco a pouco,
contudo, a imaginação de Fellini foi superando seu compromisso com a realidade.
Em "Oito e meio" já estão presentes o sonho, a fantasia e o grotesco,
que formariam a matéria-prima de sua carreira. Fellini escrevia roteiros, mas
sempre a contragosto. Dizia que era uma pena transformar em palavras o que, na
verdade, deveria ser transportado diretamente da sua imaginação para o filme.
Gostava de improvisar, de trabalhar com não-atores e de não planejar muito
sistematicamente sua rotina de trabalho. Sabia cercar-se de outros grandes
talentos, que enriqueciam os filmes e davam um suporte seguro para suas
"pirações": Giulietta Masina (atriz), Marcello Mastroianni (ator),
Nino Rotta (músico), Tonino Guerra (roteirista). Apesar de, em alguns filmes
(principalmente em sua obra-prima "Amarcord" e no feroz "Ensaio
de Orquestra") abordar temas políticos, Fellini não se sentia à vontade
com cobranças ideológicas: "Minha natureza não é política; e o discurso
político me confunde na maioria das vezes. Não o compreendo. Mas confesso isso
como uma fraqueza, como uma de minhas carências." Poucos diretores de
cinema conseguiram marcar tão claramente seu estilo, a ponto de virar adjetivo.
Dizer que tal filme ou tal personagem é "felliniano" significa
identificá-lo com a estética ao mesmo tempo barroca e popular de seus trabalhos
das décadas de 60 e 70, em que o exagero e a predileção pelo inusitado
conduzem, na verdade, a uma reflexão séria - e muitas vezes cruel - sobre o
cotidiano de seres humanos frágeis e anônimos. Em seus melhores filmes, como
"Os boas vidas", "Julieta dos espíritos", "A doce
vida", "Amarcord" e "La nave va", Fellini demonstra
que o cinema pode ser absolutamente autoral sem perder sua universalidade. DESTAQUES:
Os boas vidas (1953), As noites de Cabíria (1957), A doce vida (1960), Oito e
meio (1963), Julieta dos espíritos (1965), Fellini-Satyricon (1969), Amarcord
(1973), Ensaio de orquestra (1979), A cidade das mulheres (1980), E la nave
va" (1983), Ginger e Fred (1985), Entrevista (1987), A Voz da Lua (1990).
FRANÇOIS TRUFFAUT (1932-1984)
Nasceu em Paris, no dia 6 de Fevereiro de
1932 e faleceu, aos 52 anos, em 21 de Outubro de 1984, na cidade de
Neuilly-sur-Seine, França, vítima de um tumor cerebral. Menino problema,
cinéfilo radical, crítico de cinema militante e, aos 27 anos, diretor
consagrado no Festival de Cannes com seu primeiro longa “Os Incompreendidos”
(Les 400 Coups, 1959), François Truffaut deu aos seus filmes muito do que vivia
na própria vida. Os Incompreendidos era claramente autobiográfico, e encontrou
ali uma representação humana dele mesmo vivida pelo ator Jean Pierre Léaud,
que, ao longo de seis filmes, deu continuidade ao mesmo personagem, Antoine
Doinel, misto perfeito de Truffaut e Leaud. Como crítico e membro fundador da
revista Cahiers du Cinema, questionou com fúria juvenil o cinema francês
vigente na época, abrindo espaço para a "Nouvelle Vague” que aconteceu
principalmente com ele mesmo, Jean Luc Godard, Eric Rhomer, Alain Resnais e
Claude Chabrol. O movimento rompia com o sistema tradicional implantado pela
industria cinematográfica e defendia a produção de filmes autorais, intimistas
e de baixo orçamento, com a idéia de que o diretor é o principal criador de um
filme e deve ter total liberdade para concebê-lo. Já cineasta estabelecido nos
anos 60, entrevistou exaustivamente seu ídolo Alfred Hitchcock, numa época em
que o tempo ainda não havia dado o devido respeito ao mestre inglês. Esse
material virou o livro essencial Hitchcock/Truffaut - Entrevistas, re-editado
recentemente no Brasil. Truffaut, que filmou as crianças, as mulheres e as
relações amorosas como ninguém mais, deixou uma obra marcante com pouco mais de
20 longas consagrados que tornaram-se legado para novas gerações de cinéfilos e
cineastas. DESTAQUES: Os Incompreendidos (1959), Jules e Jim (1962), Fahrenheit
451 (1966), Garoto Selvagem (1969), A Noite Americana (1973), A História de
Adèle H., A (1975), O Quarto Verde (1978), A Mulher do Lado (1981).
GLAUBER ROCHA (1939-1981)
Cineasta, revolucionário, contestador, baiano
e nômade. Em 1964 Deus e o Diabo na Terra do Sol explode nas telas como uma
revelação. Glauber parte da convulsão e violência da terra sertaneja para
chegar a rebeldia em estado puro. O Filme é aclamado no mundo inteiro e com os
seguintes Terra em Transe e O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro,
Glauber entra para o grupo dos grandes cineastas autorais de seu tempo, é
colocado ao lado de Bergmam e Godard. ncompreendido no Brasil militarista
infestado por prisões e torturas, parte para o auto exílio. Um quebra-cabeças
biográfico e geográfico, com dezenas de viagens, mudanças de endereço, de
países, de mulheres, de amigos. Um périplo romanesco, um nomadismo radical e
vital e centenas de cartas escritas de quartos de hotel, apartamentos
provisórios dos amigos, produtores ou mulheres. Suas cartas chegam de Paris,
Londres, Nova York, Barcelona, Santiago do Chile, Munich, Roma, Moscou, Havana.
Fala de um “sentimento do mundo” exacerbado por esse nomadismo. Suas cartas
tornam-se relatórios minuciosos da sua vida. Aos poucos vai assumindo uma
máscara trágica: “Eu sou um apocalíptico que morrerei cedo (...). As vezes
sinto-me louco e absolutamente feliz dentro de uma infinita solidão “, diz numa
carta de junho de 1973, de Paris. Nesse exílio, Glauber realizou seus filmes
mais "impopulares" e até hoje pouco exibidos no Brasil: O Leão de
Sete Cabeças,- rodado na áfrica e Cabeças Cortadas, na Espanha. A volta de
Glauber ao Brasil se dá num clima de esgotamento e descrença. Em carta de Los
Angeles, de junho de 1976, para o amigo Cacá Diegues, se expressa assim: “Estou
cansado desta odisséia... por que estou nesta situação? o que é que há comigo?
Tenho planos de filmar aqui, but aqui se pode ganhar facilmente muito dinheiro,
but não dá pé... é deserto... é triste... o mundo todo triste... a China
morta... Rússia morta... Europa morta... Ásia morta... África pré-histórica...
América Latina subdesenvolvida... ah, a única solução é fundar no Brasil um
Estado Novo com Cinema Novo... uf, ah.” De volta ao Brasil, Glauber ocupa simultaneamente
todas as páginas dos cadernos culturais dos principais jornais e revistas do
Rio, São Paulo, Bahia, Brasília. Seus artigos, entrevistas, rompantes provocam
debates apaixonados. Porém Glauber não consegue financiamentos para seus
projetos. Em 1977 outro escândalo. Glauber Invade o velório do pintor
modernista Di Cavalcanti e narra o enterro como se fosse uma partida de
futebol. Protestos e a interdição do filme pela filha do pintor, Elizabeth
Cavalcanti que alega que Glauber teria desrespeitado a memória do pai,
invadindo o velório de Di no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro com sua
equipe, usando na trilha sonora do filme marchinhas carnavalescas sobre as
imagens do cadáver do pintor. Até hoje o filme, que ganharia prêmio especial do
júri em Cannes, em 77, está proibido judicialmente no Brasil. A década de 80
começa cheia de impasses. A realização de seu último filme, o emblemático A
Idade da Terra e sua rejeição no Festival de Veneza e no Brasil, a morte do
pai, Adamastor, além das incontáveis polêmicas, intervenções, entrevistas e
artigos de Glauber na imprensa. Em 1981 Glauber viaja para Paris e depois
Sintra, em Portugal, onde, depois de um curto período, adoece gravemente e
retorna ao Brasil para se tratar. Não resiste e morre. Até hoje não se sabe ao
certo de quê. Seu enterro foi um grande acontecimento. “é preciso fechar essa
miserável década”, dizia em 1979. Sua morte foi carnavalizada, como fez no
enterro de Di Cavalcanti. O velório no Parque Lage, cenário de Terra em Transe,
fechou uma era cultural no Brasil, provocando o transe, a ira, o choro, os
últimos discursos inflamados de agosto, as últimas brigas e acusações, as
últimas polêmicas culturais. “Para ser um verdadeiro artista, não basta ter
talento, é preciso ter coragem”. PRINCIPAIS FILMES: Barravento (1961), Deus e o
Diabo na Terra do Sol (1964), Terra em Transe (1967), O Dragão da maldade
Contra o Santo Guerreiro (1969), O Leão de Sete Cabeças (Der Leone Have Sept
Cabeças) (1970), Cabeças Cortadas (Cabezas Cortadas) (1970), Câncer (1972),
História do Brasil (1974), DI - curta-metragem (1977), A Idade da Terra (1981).
INGMAR BERGMAN (1918-2007)
Bergman foi a figura mais destacada do cinema
escandinavo. Ultrapassou as fronteiras da Suécia e atingiu a universalidade
abordando temas intrínsecos à existência humana. Filho de um pastor
protestante, Ernest Ingmar Bergman teve formação luterana e descobriu o teatro
quando era estudante. Na Universidade de Estocolmo, estudou literatura e
historia da arte antes de trabalhar, como ajudante de produção, na ópera Real
de Estocolmo. Em 1943, pela montagem de sua obra "A morte de Gaspar",
foi contratado pelo departamento de roteiros. De 1944 a 1952, Bergman foi
diretor artístico do Teatro Municipal de Helsingborg, período em que dirigiu seu
primeiro filme "Kris" (1946) e uma serie de adaptações, em que já
apareciam suas preocupações existenciais. Em seguida fez "Jogos de
Verão" (1950) e "Um Verão com Mônica" (1952). Seus filmes eram
estrelados por seus atores favoritos: Max Von Sydow, Liv Ullmann, Harriet
Anderson, Gunnar Bjornstrand e Bibi Anderson. O amplo conjunto de sua obra
engloba desde a comédia leve ao drama psicológico ou filosófico mais profundo.
Em suas comédias, como "Uma Lição de Amor"(1954) ou "O Olho do
Diabo" (1960), destaca-se o tratamento lírico de seu conteúdo sexual.
Entre suas obras dramáticas, "O Sétimo Selo" (1956) é uma trama
medieval sobre a relação do homem com Deus e a morte. Além de premiado em
Cannes, o filme - uma obra-prima - deu a Bergman a notoriedade internacional.
No mesmo estilo denso e metafísico, sua obra engloba "Morangos
Silvestres" (1957) e "A Fonte da Donzela" (1959). Nos anos 60,
seus filmes foram ficando cada vez mais profundos, com imagens psicológicas
criadas a partir dos próprios sentimentos e da visão do diretor, caso de
"Persona" (66), "O Silêncio" (1963) e "A Hora do
Lobo" (1968). Ao contrário dos filmes americanos da época, que faziam tudo
para chamar a atenção, Bergman preferia os tons suaves, a sutileza dos movimentos,
o tempo da reflexão. Os recursos técnicos que utilizava eram os flashbacks e as
seqüências de sonhos e visões. Seus filmes da década de 70 não foram tão
elaborados, mas nem por isso são menos geniais. São os casos de "Gritos e
Sussurros" (1972), "Flauta Mágica" (1974), "O Ovo da
Serpente"(1977) e "Sonata de Outono" (1978), com a atriz Ingrid
Bergman. Em 1983, ganhou pela terceira vez o Oscar de melhor filme estrangeiro
por "Fanny e Alexander", uma recriação de sua própria infância. Foi
sua despedida como diretor do cinema. Depois, Bergman ainda dirigiu e escreveu
filmes para a televisão, e fez roteiros para o cinema. No âmbito pessoal,
casou-se cinco vezes e teve sete filhos: com Else Fisher, 1943 a 1945 (filha
Lena); com Ellen Lundström, 1945 a 1950, (dois filhos, Jan e Mats e duas
filhas, Eva e Anna); com Gun Grut, 1951 (filho Ingmar); com Käbi Laretei, 1959
a 1965 (filho Daniel Sebastian); com Ingrid von Rosen, 1971. Teve ainda uma
filha, Linn, com atriz norueguesa Liv Ullmann, em 1966. Ullmann atuou em dez
filmes de Bergman, entre eles obras-primas como "Quando Duas Mulheres
Pecam" (1966) e o já mencionado "Gritos e Sussurros" (1972).
JEAN-LUC GODARD
Jean-Luc Godard nasceu em Paris (1930). É um
cineasta franco-suíço reconhecido por um cinema vanguardista e polêmico, que
tomou como temas e assumiu como forma, de maneira ágil, original e quase sempre
provocadora, os dilemas e perplexidades do século XX. Além disso, é também um
dos principais nomes da Nouvelle Vague, movimento de cinema de vanguarga que
sugiu na frança no final dos anos 50 e que tem, além de Godard, François
Truffaut e Alan Resnais como nomes principais desse movimento. Nos anos
seguintes, Truffaut se tornou desafeto de Godard que o acusou de se render ao
sistema hollywoodiano de fazer filmes. Godard passou a infância e juventude na
Suíça e depois estudou etnologia na Sorbonne. A partir de 1952 colaborou na
revista Cahiers du Cinéma e, depois de vários curta-metragens, fez em 1959 seu
primeiro filme longo, À bout de souffle (Acossado), em que adotou inovações narrativas
e filmou com a câmera na mão, rompendo uma regra até então inviolável. Esse
filme foi um dos primeiros da Nouvelle Vague, movimento que se propunha renovar
a cinematografia francesa e revalorizava a direção, reabilitando o filme dito
de autor. Os filmes seguintes confirmaram Godard como um dos mais inventivos
diretores da Nouvelle Vague: Vivre sa vie (1962; Viver a vida), Bande à part
(1964), Alphaville (1965), Pierrot le fou (1965; O demônio das 11 horas), Deux
ou trois choses que je sais d'elle (1966; Duas ou três coisas que eu sei dela),
La Chinoise (1967; A chinesa) e Week-end (1968; Week-end à francesa). O cinema
de Godard nessa fase caracteriza-se pela mobilidade da câmera, pelos demorados
planos-seqüências, pela montagem descontínua, pela improvisação e pela
tentativa de carregar cada imagem com valores e informações contraditórios.
Após o movimento estudantil de maio de 1968, Godard criou o grupo de cinema
Dziga Vertov — assim chamado em homenagem a um cineasta russo de vanguarda — e
voltou-se para o cinema político. Pravda (1969) trata da invasão soviética da
Tchecoslováquia; Le vent d'Est (1969; Vento do Oriente), com roteiro do líder
estudantil Daniel Cohn-Bendit, desmistifica o western e Jusqu'à la victoire
(1970; Até a vitória) enfatiza a guerrilha palestina. Mais uma vez, Godard
procurou inovar a estética cinematográfica com Passion (1982), reflexão sobre a
pintura. Os filmes seguintes, como Prénom: Carmen (1983) e Je vous salue Marie
(1984), provocaram polêmica e o último deles, irreverente em relação aos
valores cristãos, esteve proibido no Brasil e em outros países. Sua filmografia
é extença e Godard filma do cinema e do vídeo, seu trabalho mais recente é
"Filme Socialismo" de 2010.
JIM JARMUSCH
É conhecido como o cineasta americano independente
(palavra que ele mesmo odeia) dos anos 80 que deu voz às pessoas
insignificantes e excluídas da sociedade, ou mesmo aquelas que são simplesmente
estranhas e fora do conceito padrão, como ele mesmo. Cult é uma definição que
persegue todos os seus trabalhos, desde a sua obra-prima “Estranhos no Paraíso”
até o mais recente “Flores Partidas”. Nascido em Akron, Ohio, em 22/02/53,
Jarmusch fixou residência em Nova York, onde foi aluno do grande cineasta
Nicholay Ray, um de seus incentivadores, na famosa New York Film School. Seus
estudos não foram até o fim, pois na sua urgência de filmar algo, logo
abandonou os mesmos utilizando o dinheiro de sua bolsa para custear seu
primeiro filme, Permanent Vacation (1980). A princípio, o filme não foi bem
recebido por seus professores, com exceção de Ray, que o ajudou. Filme de
baixíssimo orçamento mas cheio de criatividade, Permanent Vacation abriu os
olhos da crítica para esse talento promissor. Seu filme seguinte, Estranhos no
Paraíso (1982), é considerado por muito sua obra-prima e definitivamente
colocou Jarmusch como um nome a ser respeitado. Aqui já se percebe os temas
principais que irão pontuar toda a sua carreira daí em diante: longos planos
reflexivos, personagens desencontrados, a decadência da cultura americana, a
comunicação entre culturas diferentes e principalmente a falta da mesma. Jim
Jarmusch formou no cinema uma das parcerias musicais mais criativas de sua
história com Tom Waits, responsável pelas trilhas e canções dos seus melhores
filmes. Jarmusch/Waits formam uma união perfeita, incorporando ideias quanto à
ambientação e estética como ninguém. É só escutar aquela sua voz rasgada e
rouca e imediatamente podemos nos transportar ao universo onírico de Jarmusch.
É importante também lembrar a parceria de Jarmusch com o músico John Lurie, que
também atuou em alguns de seus filmes, além de compor as trilhas. Falando em
parcerias, outra que Jarmusch não abre mão é a do seu fotógrafo, o holandês
Robby Müller, que consegue criar todo aquele clima etéreo e frio que seus
filmes costumam pedir. Aliás, o cinema de Jim Jarmusch tem esse feeling todo
europeu, mas que fala de coisas americanas e expõe uma realidade que não é a
vendida pelo sonho americano. Daí a ele ser muito mais reconhecido pelos
europeus do que por seus “compatriotas”. Todos os seus filmes possuem cenas
memoráveis, como o hilário diálogo de Roberto Benigni com o taxista em Uma
Noite Sobre a Terra (1991) – seu filme mais bem sucedido financeiramente. O
mesmo Benigni em Down By Law (1983), como o forasteiro italiano tentando
entender as palavras em inglês, com seus amigos presidiários Tom Waits e John
Laurie pouco ajudando, oferece momentos impagáveis. Quem se esquece da cena do
sorvete? A dinâmica de seus personagens oferece uma abordagem honesta, comovente
e a mais despojada e natural possível. E sempre em lugares decadentes onde
quase ninguém olha ou dá importância. O método de trabalho de Jarmusch é melhor
definido por ele mesmo: “Eu me sinto melhor quando estou filmando. Filmar é
como sexo. Escrever o roteiro é como a sedução, então a filmagem em si é o
sexo, pois você está fazendo o filme com outras pessoas. A edição é como estar
grávido, então você dá a luz e eles levam o seu bebê embora".
KRZYSZTOF KIESLOWSKI (1941-1996)
Cineasta capaz de desenvolver gramáticas
visuais interessantes e únicas em filmes que transmitem estados de espírito
como poucos, e isso por meio de imagem e som antes de se valer da palavra.
Nascido em Varsóvia, Polônia, em 27 de junho de 1941, Kieslowski firmou-se
primeiro como documentarista de talento. Seu primeiro longa-metragem de ficção
foi A Cicatriz (Blizna, 1976). A consagração de Kieslowski como diretor de
filmes de ficção viria nos anos 80 com a série de TV Decálogo, co-escrita por
aquele que seria seu parceiro até o fim da carreira: Krzysztof Piesiewicz.
Inspirada nos dez mandamentos, é onde Kieslowski alia sua experiência de
documentarista a uma metafísica muito particular. Nesses filmes, ele não se
limita a ilustrar os mandamentos, mas freqüentemente foge da interpretação
convencional dos mesmos, inundando as histórias de ceticismo e ironia. A Dupla
Vida de Véronique (La Doublé Vie de Véronique, 1991), filme seguinte de
Kieslowski, é possivelmente o seu trabalho mais abertamente metafísico, um fascinante
estudo da ambigüidade intrínseca à natureza humana. Duas jovens, uma polonesa e
outra francesa (ambas interpretadas por Irène Jacob), são praticamente
idênticas, física e emocionalmente, embora jamais venham a se conhecer. No
enredo, é como se uma fosse o duplo da outra. Kieslowski procede, então, um
estudo de duas personalidades "gêmeas" em, claro, duas culturas
distintas, num filme labiríntico e lindamente obscuro. A Véronique, seguiu-se a
célebre "trilogia das cores", inspirada pelas cores e ideais
franceses (azul, branco e vermelho; liberdade, igualdade e fraternidade). A
Liberdade é Azul, o primeiro da trilogia, participamos do torpor criativo de
uma artista enquanto a mesma passa por dor insuportável. A cor azul, no caso, é
música e vice-versa. Tudo diretamente da cabeça da personagem para a nossa. Já
A Igualdade é Branca (Trois Couleurs: Blanc, 1993) é o mais "polonês"
da trilogia, e também o mais sardônico. O filme narra a vingança de um
cabeleireiro sexualmente impotente contra sua mulher (Julie Delpy), por quem
fora publicamente humilhado. O modo como se vinga é o paroxismo do masoquismo e
da auto-flagelação. O último capítulo da trilogia e derradeiro trabalho de
Kieslowski, A Fraternidade é Vermelha (Trois Couleurs: Rouge, 1994), é um milagre
cinematográfico onde praticamente todos os temas explorados pelo cineasta ao
longo de sua carreira comparecem com peso. Filme repleto de pequenas e grandes
epifanias, é algo tão pleno e definitivo que só mesmo um cineasta decidido a
abandonar o cinema (como Kieslowski anunciou após este filme) poderia
perpetrar. O voyeurismo, explícito na figura de um juiz aposentado (Jean-Louis
Trintignant) que ouve conversas telefônicas dos vizinhos, traz novamente a
contradição sobre viver a vida de outrem no lugar da nossa. Elementos como, os
objetos em cena, o silencio, as elipses, a musica - onde uma nota isolada tem a
consistência de uma lágrima, a dúvida e o acaso confluem para o todo nos filmes
de Kieslowski. Tocando fundo nos nossos medos e frustrações dessa forma, seus
filmes são demonstrações de uma sensível e complexa personalidade.O estilo
fragmentado de Kieslowski, que está expresso nos saltos narrativo-temporais,
sempre seguiu antes o estado da alma de seus personagens que um modelo
narrativo convencional. Sua originalidade está não apenas em seu ceticismo e na
visão de mundo que passava do paroxismo do pessimismo para um rascunho de
otimismo, um otimismo atingido por via de sua própria e sistemática negação,
mas também na maneira inteiramente nova com que trabalhou a imagem, o som e
seus significados mais urgentes e imediatos. Kieslowski contava suas histórias
sobretudo a partir do que mostrava. O verbo só surgia quando estritamente
necessário ou alusivo. Ele morreu em 13 de março de 1996, vitimado por um ataque
cardíaco, pouco tempo depois de ter anunciado que voltaria a filmar. FILMOGRAFIA:
A Cicatriz (1976), O Decálogo (série de 1988), Não Amarás (episódio do Decálogo
transformado em longa, 1988), Não Matarás (episódio do Decálogo transformado em
longa, 1988), A Dupla Vida de Veronique (1991), A Liberdade é Azul (1993), A
Igualdade é Branca (1993), A fraternidade é Vermelha (1994).
LUIS BUÑUEL (1900-1983)
Nasceu em Calanda a 22 de fevereiro de 1900.
Seus pais, ricos fazendeiros, lhe proporcionam uma vida muito distanciada da
realidade espanhola: estudos de música, verões em São Sebastião e Calanda.
Estudou em Zaragoza em São Salvador e fez seus estudos universitários em Madri,
na Residência dos Estudantes. Ali teve a oportunidade de embeber-se das correntes
culturais e renovadoras do momento (o Jazz, o Darwinismo, o Comunismo...) e de
conhecer Dali e Lorca. Perde a fé e adota uma atitude muito contestadora.
Licencia-se em Filosofia e letras ainda que seu objetivo fosse escrever poesia.
Muda-se para Paris, onde arranja diversos trabalhos relacionados ao cinema,
incluindo um emprego como assistente de Jean Epstein. Interessado pela obra de
André Breton e o movimento surrealista, o incorpora no cinema ao realizar sua
obra-prima, "Um cão andaluz" (1928), em colaboração com o amigo
Salvador Dalí. Em Paris também conhece sua mulher, a ginasta Jeanne Rucar com
quem viveu toda sua vida. Ao regressar à Espanha não dirige nenhum filme, a não
ser um documentário: "Terra sem pão" (Las Hurdes Tierra sin Pan,
1932), a cuja produção se dedica. Ao estourar a guerra civil na espanhola,
emigra aos Estados Unidos onde trabalha no Museu de Arte Moderna como dublador
para a Warner Bros. A oportunidade de dirigir de novo chegou no México. E ali,
com 46 anos começou a realizar filmes de maneira estável pela primeira vez.
Filma clássicos como "Os esquecidos" (Los olvidados, 1950), que lhe
rendeu o prêmio de melhor diretor no Festival de Cannes. O prestígio destes
filmes lhe deu reconhecimento mundial e no início da década de 1960 o General
Franco o convidou a voltar à Espanha. Aí filmou Viridiana, um manifesto
anti-católico que acabou por ser proibido na Espanha acusado de blasfêmia,
apesar de ter ganhado a Palma de Ouro também no Festival de Cannes. A partir de
então as viagens à Espanha e à França foram constantes. Realizou seus últimos
filmes, os mais conhecidos, na França, em colaboração com o produtor Serge
Silberman e o escritor Jean-Claude Carrière, entre eles "O discreto charme
da burguesia" (Le charme discret de la bourgeoisie, 1972) e "O
fantasma da liberdade" (Le fantôme de la liberté, 1974). No dia 29 de
julho de 1983 falece na Cidade do México aos 83 anos de idade. Destaques: 1929
- Un chien andalou (Um cão andaluz), 1930 - L'âge d'or (A idade do ouro), 1962
- El ángel exterminador (O anjo exterminador), 1967 - Belle de jour (Bela da
tarde), 1969 - La voie lactée (A Via Láctea), 1970 – Tristana, 1972 - Le charme
discret de la bourgeoisie (O discreto charme da burguesia), 1974 - Le fantôme
de la liberté (O fantasma da liberdade), 1977 - Cet obscur object du désit
(Esse obscuro objeto do desejo).
MOHSEN MAKHMALBAF
Desde o fim da década de 80, a cinematografia
do Irã vem recebendo destaque em importantes festivais e na imprensa
especializada do mundo inteiro. Diversos elementos podem ser apontados como
força-motriz desse inegável sucesso, como a curiosidade dos espectadores em
relação à produção audiovisual de um país tão sofrido, castigado por tantos
anos de conflito e pela intolerância de um governo autoritário, que inclusive
censura e impõe cortes aos filmes; as características formais desses
longas-metragens, que se aproximam de uma linguagem poética e contemplativa,
atribuída a um certo tipo de filme alternativo ou independente, que agrada em
cheio à platéia do chamado cinema de arte; e ainda o forte apoio que esses
filmes tiveram de uma parte da comunidade cinematográfica européia, que
resultou em um considerável impulso à sua visibilidade. Muito se discutiu sobre
esses filmes e seus autores desde seus surgimentos. Além da utilização de
atores não-profissionais representando problemas que enfrentam na vida real e
da filmagem em locação. Talvez a característica mais onipresente no cinema
iraniano contemporâneo que chega ao Ocidente seja o uso insistente da
metalinguagem. Um grande fascínio pelo processo cinematográfico e pela sua
interação com a realidade pontua a grande maioria desses filmes, tanto quanto
um desejo de denúncia e transformação social. Os filmes de Abbas Kiarostami,
Jafar Panahi, Mohsen e Samira Makhmalbaf, entre outros que são os que nós temos
mais acesso, enfrentam muitos problemas, principalmente em relação ao setor
cultural do governo que insiste em censurar trechos dos filmes. Como eles se
recusam a mutilar seus trabalhos, alguns desses filmes acabam sendo
integralmente banidos no Irã - o making-off do filme "O Quadro
Negro", de Samira Makhmalbaf, feito pelo irmão dela, Maysam, foi proibido
porque Samira aparece usando uma gola considerada muito baixa. Em 1996, o
consagrado diretor Mohsen Makhmalbaf - que ganhou notoriedade internacional
realizando obras como "Salve o Cinema" e "Gabbeh" -
finalizou o que se tornaria o seu filme preferido de sua obra, "Um Momento
de Inocência". Para financiar essa produção, Makhmalbaf conseguiu um
empréstimo, fazendo uma promessa de que, se o filme fosse impedido de ser
exibido, ele venderia a própria casa para pagar a dívida. Foi exatamente o que
aconteceu: o ministro da cultura da época exigiu que fossem feitos cortes no
filme, caso contrário ele não poderia ter uma carreira comercial. Makhmalbaf
reuniu sua família e perguntou se eles preferiam continuar sendo donos da casa
e permitir que "Um Momento de Inocência" fosse mutilado e perdesse
todo o significado e sentido, ou vender a casa e permitir que o filme permanecesse
banido, porém intacto. A família foi unânime na decisão de vender a casa,
elegendo a integridade artística como prioridade. Mais tarde, com o patrimônio
recuperado graças à projeção internacional e sem qualquer apoio do governo do
Irã, Mohsen montou uma escola de cinema em sua própria casa, formando uma turma
de oito alunos composta por sua família e alguns amigos. As aulas duravam
aproximadamente oito horas por dia. Os estudantes tinham diversas idades. A
mais nova era sua filha Hana - irmã de Samira, também integrante da turma - que
tinha oito anos quando o curso começou. O programa do curso consistia em focar
em unicamente uma matéria por mês. Além de disciplinas ligadas a cinema, como
Montagem, Roteiro, Fotografia, Mixagem de Som, Organização de Produção, Economia
da Produção, Análise Fílmica e História do Cinema, eram ministradas introduções
a outras artes, como pintura, poesia e música, além de outras atividades que
geralmente não são diretamente associadas à realização cinematográfica. Entre
elas, uma grande concentração em esportes (como ciclismo, natação e skate),
porque Mohsen acredita que o cineasta precisa ser fisicamente forte. Assim,
durante um mês, se andava de bicicleta durante oito horas por dia. Em outro, se
passava oito horas por dia somente em frente à ilha de edição. E em outro, só
se estudava música iraniana. Durante o curso, muitos filmes foram realizados.
Os alunos se formaram em diversas especializações diferentes - três deles
escolheram direção. Um deles foi Samira Makhmalbaf, que durante esse período
rodou "A Maçã" e "O Quadro Negro," tornando-se, com o
primeiro deles, a diretora mais jovem na história a ter um longa-metragem
exibido em sessão de gala no Festival de Cannes - ela tinha então 18 anos. Com
o segundo, ganhou o Prêmio do Júri na competição oficial do mesmo festival,
dois anos depois. Samira rapidamente tornou-se uma estrela do mundo do cinema
internacional, mostrando-se articulada e fotogênica nas inúmeras coletivas que
participa. A madrasta de Samira e mulher de Mohsen, Marziyeh Meshkini, dirigiu
um longa divido em três episódios chamado "O dia em que eu me tornei uma
mulher", que foi premiado em vários festivais internacionais, entre eles o
de Veneza e o de Chicago, e recebeu muitos elogios da imprensa internacional
por tratar com sensibilidade da opressão que as mulheres sofrem no Irã. O filho
do meio de Mohsen, Maysam, se especializou em Fotografia e Montagem. Ele montou
um dos episódios do longa da madrasta e realizou o making-off do segundo filme
de Samira. E finalmente a filha caçula, Hana Makhmalbaf, trabalhou como
assistente em "A Maçã" e rodou o curta "O dia em que minha tia
ficou doente". Peça-chave do cinema iraniano, Mohsen Makhmalbaf é hoje um
homem sem endereço. Depois de deixar Teerã, em 2005, morar na França e na
Inglaterra, o diretor prefere, por segurança, não mais dizer onde vive.
Oposicionista do regime de Mahmoud Ahmadinejad, foi ameaçado, até a vida se
tornar "inviável" para sua família. Destaques: Salve o Cinema/1995,
Gabbeh/1996, O Silêncio/1998, A Caminho de Kandahar/2001.
PETER GREENAWAY
Inicialmente a família Greenaway vivia no
País de Gales, onde nasceu em 1942, mas mudaram-se para Essex quando Peter
tinha apenas três anos de idade. Quando Peter era criança, desejava tornar-se
pintor. O interesse pela pintura foi muito importante para definir toda sua
obra artística. Cada filme de Greenaway é composto visualmente usando-se
parâmetros estéticos da pintura. O jovem Peter estudou cinema, com particular
interesse por Bergman, pela Nouvelle Vague e cineastas como Godard e
especialmente, Resnais. Em 1962 ele iniciou estudos no Walthamstow College of
Art, onde fez amizade com um estudante de música chamado Ian Dury, (a quem mais
tarde convidaria para fazer o filme The Cook, the Thief, His Wife & Her
Lover). Greenaway passou três anos em Walthamstow estudando para ser um pintor
muralista e realizando seu primeiro filme , Morte do Sentimento, um ensaio
sobre móveis de jardim de igrejas, filmado em quatro dos maiores cemitérios de
Londres. Em 1965 Greenaway juntou-se ao Central Office of Information (COI),
onde passou os próximos quinze anos trabalhando, inicialmente como editor de
filmes e como diretor. Durante esse período ele construiu uma filmografia
pessoal de filmes experimentais. Michael Nyman, autor da famosa trilha musical
de O Piano compôs várias das trilhas musicais dos filmes de Greenaway. Os
filmes de Peter Greenaway são notáveis pela presença de elementos de arte
renascentista e barroca, uso de luz natural, compondo cada cena de seus filmes
como se fossem pinturas. Greenaway também sempre se interessou por ópera tendo
escrito dez libretos, ele mesmo, para uma série nomeada "A Morte do
Compositor", enfocando dez compositores, de Anton Webern a John Lennon. Em
1980 Greenaway realizou The Falls seu primeiro longa-metragem. Foi nas décadas
de 1980 e 1990 que Greenaway produziu a parcela mais famosa de sua filmografia
como diretor. O interesse por ópera e
música levou Greenaway a produzir, em 2005, um espetáculo multimídia em
colaboração com o maestro e compositor David Lang e o calígrafo Brody
Neuenschwander Intitulado "Writing on Water". O espetáculo reuniu, ao
vivo, a orquestra London Sinfonietta, o diretor, editando ao vivo imagens em
uma mesa de vídeomaker, o compositor na regência da orquestra e o calígrafo,
todos trabalhando ao vivo simutaneamente , com o produto audiovisual sendo
lançado em um telão de grande dimensões que podia ser apreciado por uma vasta
platéia. Em 2003, Greenaway iniciou o projeto 92 Tulse Luper, que incluiu uma
apresentação ao vivo com sua mesa de plasma onde editava o video ao vivo, um
site interativo e um filme cinematográfico. DESTAQUES: 1987-A barriga do
arquiteto, 1988-Afogando em números, 1989-O cozinheiro, o ladrão, sua mulher e
o amante, 1991-Os livros de Próspero ou A última tempestade, 1993-O bebê santo
de Mâcon, 1996-O livro de cabeceira, 1999-8 Mulheres e 1/2.
PIER PAOLO PASOLINI (1922-1975)
Era filho de Carlo Alberto Pasolini, militar
de carreira, e de Susanna Colussi, professora primária, natural de Casarsa
della Delizia (Friul), ao norte da Itália. Pier Paolo Pasolini era um artista
solitário. Antes de ficar famoso como cineasta tinha sido poeta e novelista.
Entre seus livros mais conhecidos estão Meninos da Vida, Uma Vida Violenta e
Petróleo (livro). De porte atlético e estatura média, Pasolini usava óculos com
lentes muito grossas, realizou estudos para filmes sobre a Índia, a Palestina e
sobre a Oréstia, de Ésquilo, que pretendia filmar na África (Apontamento para
uma Oréstia Africana). Era homossexual assumido. Seus filmes são muito
conhecidos por criticarem a estrutura do governo italiano (na época fortemente
ligado à igreja católica), que promovia a alienação e hábitos conservadores na
sociedade. Além disso, seu cinema foi marcado por uma constante ligação com o
arcaísmo prevalecente no homem moderno. Prova disso é a obra Teorema, em que um
índividuo entra na vida de uma família e a desustrutura por inteiro (cada
membro da familia representa uma instituição da sociedade). Dirigiu os filmes
da Trilogia da Vida com conteúdo erótico e político: Il Decameron, I Raconti di
Canterbury e Il fiore delle mille e una notte. Pasolini, em um determinado
momento da sua vida, renegou esses filmes, afirmando que eles foram apropriados
erroneamente pela insdústria cultural, que os classificava como pornográficos.
Essa trilogia foi filmada na Etiópia, Índia, Irã, Nepal e Iêmen. Os filmes eram
mal dublados em italiano. Pelo conteúdo pretensamente classificado como
erótico, foi proibido nos Estados Unidos e só foi exibido na década de 80. No
Brasil só foi exibido após a abertura política. Gostava de trabalhar com atores
amadores e do povo. Foi assassinado em 1975, seu corpo tinha o rosto
desfigurado e foi encontrado no hidro aeródromo de Ostia. Os motivos de seu
assassinato continuam gerando polêmica até hoje, sendo associados a crime
político ou um mero latrocínio. Um processo judicial concluiu que o cineasta
foi assassinado por um garoto de programa, que teria o intuito de assaltá-lo.
Tal versão, porém, não se sustenta mais. Existem estudos, filmes e programas de
tv que põem por terra a versão acatada pela justiça italiana. No ano de 2005,
Pino Pelosi declarou não ter sido ele o assassino de Pasolini, depois de ter
cumprido pena como assassino confesso. DESTAQUES: Saló ou os Cento e Vinte Dias
de Sodoma (1975), As Mil e Uma Noites (1974), Os Contos de Canterbury (1972),
Decameron (1971), Pocilga (1969), Teorema (1968), Édipo Rei (1967), O Evangelho
Segundo São Mateus (1964), Medea (1969).
STANLEY KUBRICK (1928-1999)
Preocupado com suas notas ruins no colégio, o
pai de Santley Kubrick mandou-o à Califórnia para passar uma temporada com seu
tio. De volta a Nova York, como o quadro acadêmico não tivesse mudado, seu pai
iniciou-o no estudo do xadrez, que se tornou uma paixão para o jovem Kubrick.
Aos 17 anos, Stanley Kubrick começou a trabalhar como fotógrafo para a revista
"Look", viajando por toda a América nesta função. Acompanhou também
nesta época, como ouvinte, diversos cursos na Universidade de Columbia. Em 1951
lançou seu primeiro documentário, "O Dia da Luta", produzido com seus
próprios recursos ganhos através dos jogos xadrez, ao qual seguiram-se vários
curta-metragens feitos por encomenda. Dois anos depois, Kubrick rodou seu
primeiro longa-metragem, "Fogo e Desejo". Em seguida realizou "A
Morte Passou por Perto" e "O Grande Golpe". A MGM, que notando
as qualidades do jovem realizador, deu-lhe a possibilidade de realizar na
Alemanha a adaptação de uma novela de guerra, Paths of Glory (1957), com Kirk
Douglas, filme que marcou a emergência de Kubrick como um grande diretor. Essa
saga passada na primeira guerra mundial é uma inteligente e aguçada crítica à
prática militar. É também uma poderosa peça cinematográfica visto que Kubrick
sintetiza as lições que aprendeu sobre composição e movimento de camera. A
experiência foi tão positiva que Kirk Douglas o convidou mais tarde para
substituir Anthonny Mann na realização de um épico que estava encalhado,
Spartacus, seu primeiro e único trabalho contratado, típico épico dos anos 50
colorido em Technicolor. No filme que, ao contrário de todas as expectativas, Kubrick
realizou á sua maneira, participaram atores como Laurence Olivier e Tony
Curtis, além de Kirk Douglas. Um fato curioso, já testemunho de um artista sem
concessões que almeja o controlo artístico total do seu trabalho, foi o de ter
impedido Russell Metty, o diretor de fotografia, de trabalhar. Não gostando do
trabalho do técnico, ele próprio foi o responsável pela fotografia. Este
queixou-se sem resultado e, ironicamente, acabou por ganhar o Óscar de melhor
fotografia sem ter feito nada durante a realização do filme. O projeto seguinte
foi One-Eyed Jack (1961) com Marlon Brando, mas devido a incompatibilidades
entre duas personalidades tão fortes, Kubrick abandonou o filme acabando Brando
a realização do western. Desencantado com Hollywood e com a América, e depois
de mais um casamento acabado, Kubrick muda-se para a Inglaterra. Passou a
trabalhar lá desde então, desenvolvendo e produzindo apenas sete filmes em 30
anos, cada um meticulosamente trabalhado e cada um notadamente diferente dos
outros. O seu primeiro filme no outro lado do Atlântico foi o famoso e
controverso Lolita (1962), uma adaptação do romance de Vladimir Nabokov sobre o
romance de um homem de meia idade com uma jovem de apenas 12 anos. Embora
Kubrick tenha se queixado da censura tê-lo impedido de explorar a estória em
maiores detalhes (dois anos foram adicionados a idade real de Lolita), o filme
é visto hoje como um exemplo extraordinário de comédia mesclada com drama e
romance. Dr. Estranho Amor (1964), o seu filme seguinte, foi uma comédia negra
sobre a guerra fria em que Peter Sellers tinha três papéis diferentes. Aquilo
que devia ser originalmente um drama, baseado no livro Red Alert de Peter
George, foi convertido numa hilariante comédia sobre o poder nuclear, porque
Kubrick achava que o livro tinha muitas ideias que não podiam ser levadas a
sério. O filme, apesar da sua originalidade, foi um grande sucesso tanto de
público como crítico. Os sucessos de Lolita e Dr.. Strangelove Or: How I
Learned To Stop Worrying and Love the Bomb, junto com seu trabalho em Spartacus
proporcionou a Kubrick a liberdade de escolher seus próprios temas e, mais
importante, de exercer total controle sobre a produção dos filmes, uma
liberdade rara para qualquer cineasta. Em 1965 Kubrick começou a produção daquele
que é considerado por muitos o melhor filme de sempre, 2001: Odisseia no
Espaço. Inspirado por um conto de Arthur C. Clarke, A Sentinela, este filme de
1968 é uma reflexão complexa sobre o pendor do homem para a violência. Tomando
cinco anos de filmagem, o filme redefiniu as fronteiras do gênero e estabeleceu
convenções visuais, metáforas e efeitos especiais que permanecem até hoje
padrões para indústria cinematográfica. Uma hipnose visual bem como ousadamente
narrado, 2001 fez de Kubrick um herói cultural. Apesar das confusas críticas na
época de seu lançamento, provou ter sido influência estilística para diversos
filmes lançados nos últimos 25 anos. O seu trabalho seguinte, Laranja Mecânica,
baseado no ensaio satírico de Anthony Burgess do mesmo nome, é uma meditação
sobre crime e castigo. Apesar de extremamente violento, até lhe foi atribuído
um X nos Estados Unidos, depois retirado, o filme teve bastante sucesso sendo
até nomeado para vários óscares, também esteve proibido no Brasil e depois foi
liberado com as famosas "bolinhas pretas", que perseguiam as
"partes intímas" dos atores enquanto eles se movimentavam na tela.
Quem viu nunca esquecerá. "Laranja Mecânica" é um estudo sobre a
amoralidade do ser humano, que não consegue administrar seus instintos frente a
uma civilização igualmente incapaz de administrar suas contradições sociais. O
filme é muito violento e tem uma das melhores trilhas sonoras da história do
cinema. Aliás, Kubrick sempre demonstrou uma ousadia imensa na confecção do som
de seus filmes, jamais se permitindo a solução fácil da música incidental que
automaticamente sublinha o contexto dramático de cada cena. Kubrick, assim como
brinca com a imagem, brinca com o som. Em 1975 adaptou uma novela de W.
Thackery ao grande ecran, Barry Lyndon. O filme relatava a ascensão e queda de
um irlandês na Inglaterra do século XVII. O filme foi bem recebido pelo
público, mas não agradou à crítica em geral. No início dos anos oitenta
experimenta o filme de terror com The Shining, adaptação da obra homónima de
Stephen King. King não gostou do que Kubrick fez com a sua história e ele
próprio a adaptou ao cinema mais tarde. Enquanto o filme de Kubrick é uma obra
prima do cinema de terror, já ninguém se lembra do filme produzido por King.
Nesta altura, Kubrick já não se preocupa com o tempo. Entre The Shining e o seu
filme seguinte passam sete anos. Só em 1987 surge a sua nova obra, Nascido para
Matar, sobre a guerra do Vietnam, uma das obras cinematográficas fundamentais
sobre o conflito do sudoeste asiático. Novo êxito crítico e comercial. Kubrick
morreu, em Londres, no dia 07 de março de 1999, deixando pronto De Olhos Bem
Fechados, com Tom Cruise e Nicole Kidman, mais um obra ousada e impecável que
traz a sua genial assinatura.
THEO ANGELOPOULOS (1933-2012)
Aos 70 anos, Angelopoulos é o mestre das
tomadas longas, das seqüências que cruzam o tempo e de um aguardar eterno do
retorno do outro. Compondo em cada filme a espera de uma Penélope por um
Ulisses que nunca volta, o diretor tem seu olhar voltado para o exílio interno.
Sem crer na existência de passado, presente e futuro como categorias distintas,
seus filmes transitam pela história, tomando a mitologia grega como ponto de
partida. Porém, a Grécia de Angelopoulos não é a Grécia de ensolarado verão e
de ilhas paradisíacas que atrai milhões de turistas do mundo inteiro. A Grécia
de Angelopoulos é outra. É a Grécia do norte, de paisagens invernais, composta
pela chuva, pela neve e pela neblina. É nessa região que estão situadas as
fronteiras com a Albânia, a Macedônia, a Bulgária e a Turquia, local dos
refugiados presentes em vários de seus filmes. É onde estão, partem ou chegam,
todos os seus personagens. Seus cenários refletem o estado de ser desses seres.
Figuras que não podem ser vistas como indivíduos, mas como contornos de um
tempo, de uma época. À sombra de Homero, Angelopoulos continua a fazer jus ao
que disse em uma entrevista concedida há cinco anos atrás: “Filmes que
valorizam o espectador são recheados de questões, a maioria delas sem resposta.
O verdadeiro desenrolar de um filme está no encontro de dois olhares: o do
diretor e o do espectador. Sem esse encontro, o filme não pode existir, é
apenas celulóide”. O cinema de Angelopoulos é um cinema singular, único na
história desta arte. Não se filia a nenhuma escola, ou movimento, assim como
não segue nenhuma tendência imposta por modismos. Tem um certo parentesco com o
cinema de Andrei Tarkovsky, pois ambos refletem sobre os problemas que afligem
o homem contemporâneo, e os dois utilizam os planos de longa duração na
narrativa de seus filmes. Mas, enquanto o cinema de Tarkovsky é voltado para
uma contemplação mística dos elementos da natureza (a terra, o fogo, o vento, a
água) e uma abordagem filosófica da natureza humana, o cinema de Angelopoulos é
mais centrado na história e na cultura da Grécia e nos problemas do homem no
contexto político da atualidade. Como a viagem é o tema mais recorrente na obra
de Angelopoulos, seja o retorno de um imigrante ou um exilado a sua terra
natal, a viagem por acontecimentos políticos da história, ou a viagem de uma
pessoa em busca do seu passado para encontrar a si mesma no presente, as
locações que aparecem são aquelas que lembram o movimento: estações
ferroviárias, trens, estradas, ônibus, caminhões, mares, portos, navios, rios e
bares de beira de estrada. Assim como é recorrente a presença da neve, da chuva
e da neblina, pois todos os seus filmes se passam no inverno, estação que
reflete o sentimento de melancolia presente em sua obra. Angelopoulos é dono de
um inconfundível estilo de filmar. O primeiro elemento que chama a atenção no
seu estilo é que todos os seus filmes se compõem de planos longos e
planos-sequência que dão um ritmo acentuadamente lento à narrativa. A título de
exemplo, enquanto no cinema clássico americano um filme de 90 minutos é
composto, em média, por mais de 500 planos, “Paisagem na Neblina” tem 88 planos
em 120 minutos, e “Um Olhar a Cada Dia” 78 planos para quase três horas de
filme. Esse ritmo lento da narrativa, através de longos planos, dilata o espaço
temporal da cena, imprime a característica de um olhar contemplativo, e permite
ao espectador a escolha de fixar-se nos detalhes que mais lhe chamem a atenção.
Na rigorosa composição de imagem, nada é filmado por acaso. Os cenários são
criteriosamente escolhidos e trabalhados e existe um rigor geométrico na
distribuição de personagens, figurantes e objetos em cena. O cinema de
Angelopoulos é o registro do inquietante pensamento de um artista voltado para
os cruciais problemas humanos do nosso tempo. Sua extraordinária obra é uma
espécie de sinfonia de imagens alegóricas de transcendental poesia. Mas,
enquanto a estrutura da sinfonia na música se divide em movimentos diferentes
como allegro, adágio, scherzo, etc., sua sinfonia é formada por um adágio
longamente desenvolvido. Angelopoulos tem, entre críticos, estudiosos e
cinéfilos, admiradores que se espalham por todos os lugares onde seus filmes
tiveram o privilégio de ser exibidos. É reconhecido como um dos grandes artistas
do nosso tempo. DESTAQUES: (1986)“O melissokomos” (“O Apicultor”), (1988)“Topio
stin omichli” (“Paisagem na Neblina”), (1991) “To meteoro vima tou pelargou”
(“O Passo Suspenso da Cegonha”), (1995) “Um Olhar a Cada Dia” (“To vlemma tou
Odyssea”), (1998)“A Eternidade e um Dia” (“Mia eoniotita ke mia mera”), (2005)
o Vale dos Lamentos.
WERNER HERZOG
Nasceu em Munique, aos 5 de setembro de 1942.
É um dos maiores representantes do novo cinema alemão, movimento que surgiu nos
anos 70. Embora seja mais conhecido por seus filmes de ficção, ele é tido como
um excelente documentarista e, ao longo de sua carreira, dividiu-se entre os
dois gêneros. A maioria de seus documentários nunca passou no Brasil e, segundo
a crítica européia, possuem um estilo pessoal e ares de ficção. Em
contrapartida, muitos de seus filmes de ficção têm um pé no documentário.
"Coração de Cristal", por exemplo, passa muito tempo na fábrica de
vidro, e "Onde Sonham as Formigas Verdes" por vezes mais parece um
documentário. É um autor completo, sendo responsável pelo roteiro, produção e
realização da maioria de seus filmes. Ao mesmo tempo, é um símbolo do cinema
aventureiro, capaz de tudo para concretizar seus sonhos. Vale desde usar uma
câmera roubada até levar toda a equipe para um trecho desconhecido da floresta
amazônica ("Aguirre" e "Fitzcarraldo"). Ou ainda,
hipnotizar todos os atores ("Coração de Cristal"). Pode-se mostrar
dois bons exemplos de sua personalidade amalucada. Herzog era muito amigo da respeitada
crítica alemã Lotte Eisner, autora do belo ensaio "A Tela Demoníaca",
entre outros. Essa veterana crítica apoiava veementemente o novo cinema alemão,
que inicialmente não foi bem recebido pelos jornalistas. No início dos anos 80,
ela ficou muito doente e Herzog prometeu que, se ela melhorasse, faria a pé o
percurso entre Munique e Paris. Lotte realmente melhorou (mas morreu pouco
tempo depois) e o diretor cumpriu a promessa, chegando a escrever o livro
"Caminhando no Gelo", editado no Brasil, durante a longa caminhada,
com reflexões sobre a vida. Em outro lance curioso, apostou com o então
estudante americano de cinema Errol Morris que se ele, Errol, conseguisse
realizar determinado filme, Herzog comeria os próprios sapatos. O resultado foi
que o alemão perdeu a aposta e, como Carlitos em "Em Busca do Ouro",
saboreou seu filé de sola. O fato ficou registrado no estranhíssimo
documentário "Werner Herzog Eats his Shoes", dirigido por Les Blanks.
O primeiro curta de Herzog, "Herakles" (1962), foi filmado quando ele
estava em seu primeiro ano na Universidade de Munique. Detalhe: ele usou uma
câmera roubada, mostrando que a regra do alemão, como se veria ao longo de sua
carreira, é que vale tudo para fazer um filme, inclusive enfrentar a floresta
amazônica durante meses com uma equipe à beira da loucura. Para entender melhor
a obsessão do diretor, é fundamental assistir a um de seus documentários mais
recentes, "Meu Melhor Inimigo", onde ele retrata sua relação com
Klaus Kinski, amigo e parceiro nos filmes mais importantes. Nele, fica claro
não apenas o talento visceral desse autor, como também sua boa dose de loucura.
A cena em que Kinski quer abandonar as filmagens de "Aguirre, a Cólera dos
Deuses", e Herzog ameaça pegar um rifle para detê-lo, é emblemática.
Kinski merece um capítulo à parte. Nasceu em 1926, na cidade portuária alemã de
Sopot, que hoje pertence à Polônia e mudou de nome para Gdansk, sendo mais
famosa como o berço do sindicato Solidariedade. Ele chegou a lutar na 2ª Guerra
Mundial e foi prisioneiro do exército britânico. Com o fim da guerra, começou a
atuar no teatro. A seguir, foi para o cinema, na maioria das vezes
interpretando vilões, nos anos 50 e 60. Seu estilo agressivo e passional chamou
a atenção de Herzog, que a partir de 1972 o convidaria a atuar em seus filmes mais
importantes. Curiosamente, ele escreveu uma biografia intitulada "All I
Need Is Love", inédita no Brasil, onde critica Herzog, considerando-o um
tirano. A crítica considera a biografia um tanto tresloucada. Em "Meu
Melhor Inimigo", os dois falam sobre essa biografia e Kinski tira o corpo
fora, afirmando que tais afirmações foram feitas apenas para o livro vender
mais. Kinski morreu em 1991. Outro estranho “ator” chamado por Herzog para
atuar em dois de seus grande filmes (O Enigma de Kaspar Hauser e Stroszeck)
chama-se simplesmente Bruno S., um ex-interno de instituições, que ele conheceu
em um documentário alemão e achou que cairia bem para o papel. Bruno teve uma
vida problemática. Era filho de uma prostituta e apanhava muito da mãe,
chegando a ter problemas auditivos. Aos três anos foi separado dela e enviado a
reformatórios e instituições de tratamento de doentes mentais. Com todas as
dificuldades, estudou música, tocando piano e acordeão, habilidades que usaria
em "Strozeck". Ele só fez esses dois filmes, pois tinha enorme
dificuldade em decorar suas falas. Apesar do papel de destaque que ocupa na
história do cinema mundial, Herzog é um nome praticamente ignorado pelos
estúdios, nos lançamentos de vídeo e DVD. Em vídeo, a maioria de seus filmes
foi lançada há mais de 15 anos, existindo apenas em locadoras que se preocupam
com a qualidade do acervo. É uma pena. Os filmes de Herzog são delirantes,
visionários e imprevisíveis, lapidados por mãos que, por vezes, parecem
pesadas, mas que na verdade, nadam de braçada contra a corrente da mesmice e da
mediocridade. DESTAQUES: (1970)"Todos os Anões Nascem Pequenos",
(1971)"Fata Morgana" e "Terra de Silêncio e Escuridão",
(1972)"Aguirre, a Cólera dos Deuses", (1974) "O Enigma de Kaspar
Hauser", (1976) "Coração de Cristal" ("Herz Aus
Glas"), (1977) "Stroszeck", (1978) "Nosferatu, o Vampiro da
Noite", (1978) "Woyzeck", (1981) "Fitzcarraldo",
(1987) "Cobra Verde", (1993) "Os Sinos do Abismo", (1999)
"Meu Melhor Inimigo", (2005) “O Homem Urso”.
WIM WENDERS
Nascido em 14 de agosto de 1945, Wilhelm
Ernest Wenders, mais conhecido como Wim Wenders. É estranho imaginar o diretor
como cinqüentão, da mesma maneira que é dificil pensar em um roqueiro
aposentado. Esta imagem inquieta está diretamente ligada aos seus filmes, nos
quais a vida tem sempre uma grande dose de questionamento. lsso fez dele o mais
internacional dos cineastas do Novo Cinema Alemão, "pai" de
personagens em constante crise existencial e de trajetória incerta. Antes de se
dedicar ao cinema, Wenders, nascido em Düsseldorf, estudou filosofia e medicina
na Universidade de Freiburg, também na Alemanha. Logo desistiu dos sofismas e
laboratórios para investigar o ser humano através das películas, entrando para
a Hochshule für Film und Fernsehen (Escola Superior de Cinema e Televisão), de
Munique. Entre 1967 e 1970, conciliou o curso com viagens a Paris, onde estudou
pintura. Desde criança, Wenders se interessa por outras culturas e vaga por
vários países. Seu primeiro longa-metragem profissional foi O Medo do Goleiro
Diante do Pênalti I Die Angst des Tormanns Beim Elfmetter (1971). O filme se
baseia em novela de Peter Handke, amigo do diretor, que colaborou
posteriormente nos filmes Movimento em Falso/Falsche Bewegung (1975) e Asas do
Desejo/Wings of Desire (1988). Com Alice nas Cidades/Alice in den Staedten
(1973), Wenders começa a se projetar e entra no mundo dos.road movies, com
personagens que trocam de geografia procurando respostas para seus conflitos.
Com O Amigo Americano/Der Americanische Freund (1977), adaptação de uma novela
da escritora Patricia Highsmith, o cineasta ganha fama internacional. O filme é
um dos mais significativos da trajetória do cineasta, mostrando a associação e
o confronto entre um alemão e um americano. Em 1982, Wenders segue o inevitàvel
caminho rumo a Hollywood e dirige Hammet, O Falcão Maltês/Hammet, para a
produtora Zoetrope, do diretor Francis Ford Coppola. A experiência não é das
mais satisfatórias para Wenders, que nas folgas rodou O Estado das Coisas/Der
Stand der Dinge (1982), em Lisboa. Apesar de ter se tornado parte da indústria
cinematogràfica, ele sempre procurou fazer um cinema de autor, como nos tempos
da nouvelle vague, o que às vezes lhe valeu o rótulo de ingênuo. Com Paris,
Texas (1984), ele fez seu trabalho mais popular e ganhou a Palma de Ouro em
Cannes. O filme é uma combinação de boas escolhas, a começar pelo elenco, que
traz Nastassja Kinski em sua melhor forma. Em 1987, Wenders finalizou o poético
Asas do Desejo, sobre anjos que observam a desordem afetiva e material dos
habitantes de Berlim. No filme, Wenders derrubou não o muro que separou as duas
Alemanhas, mas procurou uma espécie de língua comum para uma certa ordem
celestial e o mundo terrestre. Depois, fez a continuação da história: Tão
Longe, Tão Pertoyin Weiter Ferne, So Nah! (1993). Com Até o Rm do Mundoy Until
The End of the World (1991), Wenders realizou um projeto de muitos anos, mas
não foi bem recebido pela cfitica, partindo depois para O Céu de Lisboa/Lisbon
Story (1995), quando escrevia o roteiro à noite, junto com a mulher, Donata, e
rodava no dia seguinte. Feito em Portugal, o filme retoma o fascínio de Wenders
por Lisboa e tem uma certa indefinição de proposta. Em seguida, junto com
Michelangelo Antonioni, Wenders participou das filmagens de Além das Nuvens,
mas diz que não se sente autor do filme. Retornou a Hollywood para fazer The
End of Violence, que detona com o estilo explosivo de cineastas como Quentin
Tarantino. Depois de uma indicação ao Oscar de Melhor Documentário com o
festivo Buena Vista Social Club, sucesso de público em toda parte, o diretor
venceu em 2000 o Urso de Prata de direção no Festival de Berlim com o estiloso
'O Hotel de Um Milhão de Dólares', que tem história, produção executiva e
música de Bono, junto com o U2. Na capital alemã, Wenders é normalmente visto
pelas ruas, andando de metrô, comendo uma tradicional "currywurst" ou
nas idas e vindas dos aeroportos. Apesar de estar há quase 40 anos no mercado
cinematográfico, Wenders procura se manter sempre atualizado. Em 2006, ele
fundou em Berlim a produtora Neue Road Movies, que incentiva diretores jovens e
inovadores. Seu mais recentre filme é chama-se Pina, produzido com a tecnologia
3D, sobre Pina Bausch, a coreógrafa do Tanztheater Wuppertal que morreu
repentinamente em 2010.